domingo, 11 de novembro de 2012
Lisboa funde 12 freguesias históricas numa só
Poucos saberão que Santa Maria Maior, o nome escolhido para a futura 'mega freguesia' que envolve toda a encosta do Castelo e a Baixa da capital, foi o nome dado à Sé de Lisboa aquando da conquista da cidade aos mouros.
Santa Maria Maior não vingou como nome da Sé e Joaquim Guerra de Sousa (PSD), presidente da Junta dos Mártires, a mais antiga e também a mais pequena de Lisboa (com pouco mais de 300 eleitores), teme que o mesmo aconteça com a futura 'mega freguesia'.
“Os Mártires podem ser uma freguesia pequena, mas temos mais população durante o dia nesta freguesia do que a maior parte dos concelhos do país. E quando reparamos um passeio, reparamos um jardim ou fazemos qualquer intervenção no espaço público não é para a população que reside, mas para toda a população que usa esse espaço público e essa situação, na minha óptica, não foi devidamente estudada nem tida em conta”, aponta o autarca.
Desta forma, duvida que a nova futura junta vá conseguir prestar um serviço público tão eficaz como o que é feito actualmente, até porque as 12 freguesias a agregar têm realidades muito diversas.
“Por outro lado, não vai haver uma diminuição da despesa pública. Os funcionários vão continuar, a despesa tem de ser feita e até se fala num aumento de transferências”, sublinhou.
A Junta da Madalena tem mais de 300 eleitores, divididos entre uma população idosa, com dificuldades, e os novos habitantes da Baixa, de segmento médio alto e alto.
“Continuamos a ter de resolver aqui problemas graves, que se prendem com a alimentação das pessoas e situações graves de pagamentos imediatos de medicamentos, de uma conta de luz ou de uma conta de água”, salientou, considerando que com uma mega freguesia se vai perder a proximidade aos cidadãos.
“Se o projecto for avante, passa a haver um executivo de cinco pessoas e depois haverá um exército de assessores e sub-assessores. Não quer dizer que os problemas não vão ser resolvidos, mas vão, no nosso ponto de vista, demorar muito mais tempo a serem resolvidos”, acrescentou.
Mais otimista, a presidente da Junta do Socorro, Maria João Bernardino Correia (PS), considera que a população vai ganhar, porque, com as novas competências, “passará a ter outro tipo de acompanhamento que, neste momento, as juntas de freguesia, pelos seus fracos orçamentos, não podem dar”.
Esta talvez seja a freguesia mais multicultural do país. Representa cerca de três mil eleitores recenseados, mas a maioria dos habitantes da Mouraria são imigrantes, pelo que, na realidade, serão 10 ou 11 mil as pessoas que recorrem ao Socorro.
A futura Santa Maria Maior deverá ter cerca de 14 mil eleitores oficiais, mas nem isso tira o otimismo a Maria João Correia.
“Acredito que continuará a haver um posto de atendimento de proximidade que permita às pessoas se identificarem com quem está a trabalhar numa junta de freguesia e continuará a haver esse elo de ligação”, salientou.
No entanto, admite que as pessoas mais idosas poderão “ter alguma dificuldade em entender” as mudanças e defende que terá de ser feito um trabalho de esclarecimento.Lusa
sexta-feira, 14 de setembro de 2012
Junta de Benfica entrega ajustes directos a colegas e amigos do PS
A Junta de Freguesia de Benfica adjudicou no mês de Julho duas empreitadas no total de 134.576 euros, por ajuste directo, a uma empresa com ligações ao Partido Socialista. Num dos casos, parte dos trabalhos acabou por ser feita por pessoal da autarquia. Já neste mandato, a junta contratou também, por 26.400 euros, um membro do secretariado do PS de Lisboa, que dirige as suas obras e trabalha há pelo menos uma década com um dos donos da empresa agora contratada. Um outro ajuste directo contemplou um ex-vereador socialista da Câmara de Lisboa com mais 64.800 euros.
Na manhã desta quinta-feira, a presidente da Junta de Freguesia de Benfica, Inês Drummond, participou na abertura do ano lectivo na escola primária do Bairro da Boavista, situado entre a CRIL e Monsanto, perto do Parque de Campismo. A cerimónia diz respeito à inauguração das obras ali efectuadas pela junta durante o mês de Agosto - com verbas disponibilizadas pela Câmara de Lisboa - através de uma empresa a quem os trabalhos foram adjudicados por 87.828 euros.
Logo à entrada, a autarca deparou-se com um portão de ferro de grandes dimensões a rodar nos gonzos e que antes das férias mal se conseguia fechar. A sua reparação, que incluía uma intervenção em cinco metros quadrados de betão, constava do caderno de encargos da empreitada adjudicada à Reformact no fim de Julho. O trabalho feito, porém, não inclui qualquer mexida no betão e não passou pela empresa em causa: saiu inteirinho das mãos de um serralheiro desempregado que o centro de emprego pôs a trabalhar na Junta de Freguesia de Benfica e que na semana passada executou os serviços envergando uma T-shirt preta da autarquia.
Quem fez o quê?
A Reformact já tinha saído da obra há vários dias e no local há quem garanta que a mesma pouco mais fez do que pintar o edifício e tapar alguns buracos nas paredes. O caderno de encargos, todavia, obrigava-a a picar as paredes numa área de 400 m2 e a refazer integralmente a argamassa e o reboco nesses locais.
As dúvidas sobre o que a empresa fez de facto com os 88 mil euros que recebeu, que o PÚBLICO tentou esclarecer e que vão muito para lá do portão e dos rebocos, não puderam ser esclarecidas. Inês Drummond, que aceitou visitar o local com o jornalista, nada sabia sobre os aspectos técnicos da obra e não respondeu aos pedidos feitos para consultar os relatórios diários que a empresa e o arquitecto nomeado pela autarquia para fiscalizar os trabalhos estavam obrigados a apresentar. As múltiplas tentativas efectuadas para falar com os arquitectos Miguel Gama, o técnico designado pela junta para fiscalizar a obra, e Nuno Cortiços, sócio com 50% do capital da Reformact, empresa constituída há dez meses, também não tiveram qualquer resposta.
Mas as perplexidades suscitadas pelas relações entre a autarquia e a Refromact ultrapassam o cumprimento ou não do caderno de encargos. A empresa foi contratada por ajuste directo ao abrigo da norma que dispensa os concursos em casos de "urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevistos". Ora a escola estava num estado lastimável há anos e os contactos entre o consultor da junta para as obras, Miguel Gama, e a empresa de Nuno Cortiços tinham-se iniciado mais de um mês antes de o executivo da freguesia decidir, em 19 de Julho, convidá-la a apresentar uma proposta sem consultar qualquer outro empreiteiro.
O convite, enviado no dia 20, referia um valor-base exactamente igual ao que a Reformact apresentara três semanas antes num orçamento remetido a Miguel Gama e que já estivera na base da aprovação pela Câmara de Lisboa, no dia anterior (19 de Julho), de uma transferência de igual montante para a junta pagar a obra. A proposta da empresa, com o valor que já estava no orçamento, mas agora com os preços parcelares correspondentes aos itens do caderno de encargos, foi mandada nesse mesmo dia 20, sendo a adjudicação aprovada pelo executivo a 26 e o contrato assinado no mesmo dia.De acordo com Inês Drummond, foi apenas consultada a Reformact "porque ela se dirigiu à junta e apresentou os seus serviços" e a lei permite consultar apenas uma empresa. Contrariamente ao que é habitual, porém, o júri de três pessoas que fora nomeado para acompanhar o processo não teve qualquer intervenção na apreciação da proposta, nem apresentou qualquer relatório.
Obras na piscina
No próprio dia em que foi designado para dirigir o procedimento relativo à escola e em que foi decidido pedir uma proposta à Reformact, o mesmo júri apresentou, aliás, um relatório respeitante a um outro ajuste directo em que esta empresa também foi consultada. Tratava-se de uma obra de construção civil para requalificação do hall da piscina da junta, tendo a autarquia optado, no final de Junho, por consultar três firmas, com base num estudo efectuado por Miguel Gama, através da empresa Adtempus, de que é proprietário.
Uma das consultadas foi a Reformact, com quem Miguel Gama já estava a tratar da obra do Bairro da Boavista. Outra foi a Hidro-Europa, uma empresa especializada em instalações térmicas à qual a junta adjudicara em 2011 a renovação da ventilação da piscina por 95.500 euros, e a terceira foi um empresário em nome individual. Este último não respondeu e a empreitada foi adjudicada à Reformact, conforme proposto pelo júri, pelo valor de 46.924 euros - inferior em 166 euros à proposta da Hidro-Europa.
As duas empresas não têm qualquer sócio em comum, mas na Hidro-Europa responderam ao telefone que Nuno Cortiços, da Reformact, "não está neste momento", acrescentando que ele pode ser contactado no Atelier das Picoas, uma empresa de que é sócio e cujo Número de Identificação Fiscal consta estranhamente dos contratos celebrados com a Junta de Benfica como se fosse o da Reformact.
Ligações entre arquitectos
Questionada pelo PÚBLICO acerca da forma como a Reformact surgiu na autarquia, Inês Drummond respondeu que a empresa ofereceu os seus serviços "como dezenas de outras" e garantiu que apenas conheceu Nuno Cortiços "a meio de Agosto, durante as obras da escola". De igual modo, negou saber de quaisquer relações entre o arquitecto consultor da junta e o sócio da Reformact, ou entre este e o PS.
Sucede que Cortiços fez parte de um blogue de apoio à candidatura de António Costa à Câmara de Lisboa, juntamente com a própria autarca de Benfica, Miguel Gama e três dezenas de militantes socialistas. Além disso, Miguel Gama, que tem assento com Inês Drummond no secretariado do PS de Lisboa, tem ligações profissionais há mais de uma década a Nuno Cortiços.
Ambos são professores da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa e trabalharam com António José Morais, um outro professor da mesma faculdade, que está a ser julgado desde esta terça-feira por corrupção no processo da Cova da Beira. Morais, que foi professor de José Sócrates na Universidade Independente, dirigiu o Gabinete de Estudos e Planeamento de Instalações do Ministério da Administração Interna entre 1996 e 2002, departamento onde também trabalhava o actual deputado e presidente do PS de Lisboa, Rui Paulo Figueiredo, e ao qual Gama e Cortiços estiveram ligados.
Miguel Gama, que também trabalhou com Morais no Instituto de Gestão Financeira do Ministério da Justiça, foi sócio do professor numa empresa de construção civil (Lisparra) e é actualmente coordenador do PS de Carnide, do qual Morais também foi dirigente.A contratação da Adtempus, de que Gama é sócio com a mulher, foi feita pela Junta de Benfica em Fevereiro do ano passado, ao abrigo da mesma norma que permite o recurso ao ajuste directo em caso de "urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis". O contrato contempla a prestação de apoio técnico às obras lançadas pela autarquia e tinha um valor inicial de 18.000 euros para três anos de serviço - valor que foi aumentado para 26.400 euros já este ano.
Alheio a estas relações, mas também beneficiário de um contrato com a Junta de Benfica, é o advogado Nuno Baltazar Mendes, que foi vereador do PS quando João Soares era presidente da Câmara de Lisboa. A sociedade de advogados que lidera foi contratada em Julho de 2010, igualmente por ajuste directo, para prestar serviços jurídicos à autarquia, durante três anos, por 64.800 euros.
"Orgulho-me da transparência"
"Se há alguma coisa de que me orgulho, é de ter trazido mais transparência a todos os processos de contratação da junta", afirma Inês Drummond. A autarca diz que tem tentado "optimizar os procedimentos", conseguindo "baixar os preços". Quanto à escolha das empresas, afirmou: "Consultamos empresas com quem já trabalhámos e das quais temos referências positivas." E por que é que para a Boavista contactaram apenas uma? "Consultámos a que se nos apresentou."
Empresa ligada a Conde Rodrigues
AJunta de Benfica adjudicou, também em Julho, uma obra de 23.485 euros a uma empresa de que é consultor o ex-secretário de Estado da Justiça Conde Rodrigues (PS) - com o qual Miguel Gama trabalhou no Ministério da Justiça. A empreitada prende-se com a substituição de quadros eléctricos e foi adjudicada à Electrotejo por menos 515 euros do que o preço proposto por outra empresa - mas por um valor bastante superior ao informalmente proposto por outros fornecedores.
Na sequência de várias consultas, a junta solicitou um orçamento à Electrotejo, uma firma de Almeirim, que avançou um valor da ordem dos 40.000 euros. Mais tarde, porém, formalizou uma proposta substancialmente mais baixa (23.485 euros), a qual acabou por ser escolhida.
Inês Drummond começou por garantir ao PÚBLICO que não teve qualquer contacto com Conde Rodrigues, lembrando-se depois de que tinha tido uma reunião com ele, "há cerca de um mês", em que o ex-secretário de Estado lhe apresentou uma proposta - "que não foi aceite" - de serviços de auditoria da empresa Deloitte, de que também é consultor.
Quanto à Electrotejo, assegurou ignorar que ele tivesse relações com esta empresa. Uma administradora da firma admitiu, todavia, uma ligação a Conde Rodrigues, que o próprio confirmou depois. "Presto consultoria à Electrotejo, mas na área das relações com a banca." Quanto aos quadros eléctricos, garantiu que nem sabia que a empresa tinha apresentado uma proposta à junta. "O que não quer dizer que alguém não tenha invocado o meu nome sem o meu conhecimento", frisou o ex-candidato a juiz do Tribunal Constitucional.(Público)
segunda-feira, 5 de abril de 2010
Secretários de Estado de Sócrates acumulam apoio do Estado para alojamento, mesmo tendo casa em Lisboa
Três secretários de Estado do actual Governo vão ter direito a um subsídio de alojamento no valor de 16.800 euros anuais, isto apesar de serem proprietários de casas na região de Lisboa. No total, são 13 os governantes a beneficiar deste tipo de apoio - que se traduz em 47 euros por dia, 1.400 euros por mês. Ou seja, a cada ano sairão dos cofres do Estado 218 mil euros para estes subsídios ao Executivo.
De acordo com a lei – um decreto de 1980 –, os membros do Governo têm direito a esta compensação monetária quando, «ao serem nomeados, não tenham residência permanente em Lisboa ou numa área circundante de 100 quilómetros». Ao abrigo desta alínea, quatro ministros e nove secretários de Estado requereram estas ajudas de custo.
Entre estes últimos há três que têm uma particularidade: a residência permanente fica a mais de 100 quilómetros de Lisboa, mas nas declarações de património entregues no Tribunal Constitucional declaram também a propriedade de uma casa na região de Lisboa. É o caso de Laurentino Dias, secretário de Estado da Juventude e do Desporto (com residência de origem em Fafe); de Maria Manuel Leitão Marques, secretária de Estado da Modernização Administrativa (morada de origem em Coimbra); e de Fernando Serrasqueiro (de Castelo Branco), secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, que declara uma casa na Costa da Caparica.
Estes casos específicos não merecem qualquer ressalva na lei – que fala em «residência permanente», com os vários requerentes a dar a sua morada de origem. O conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República já se pronunciou sobre a matéria, admitindo a atribuição de subsídio mesmo a quem possui casa em Lisboa.
Entre os 13 governantes, há vários que vivem há anos na capital. É o caso do ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, que declara residência permanente no Funchal. O ministro da Agricultura, António Serrano, tem residência em Évora, enquanto o ministro da Justiça, Alberto Martins, vive no Porto. Já a ministra do Trabalho, Helena André, dá como residência Oeiras. O gabinete da ministra ressalva que Helena André vivia em Bruxelas até ser nomeada para o Governo, tendo pois direito a subsídio.
Entre os secretários de Estado, além dos já citados, beneficiam de apoio Óscar Gaspar (Maia) e Manuel Pizarro (Porto), da Saúde; Carlos Zorrinho (Évora), secretário de Estado da Energia; Bernardo Trindade (Funchal), responsável pelo Turismo; José Junqueiro (Viseu), da Administração Local; e Alexandre Ventura, da Educação.
Na última legislatura, também Teixeira dos Santos, (com residência no Porto), pediu apoio. O ministro das Finanças não consta da lista agora publicada em Diário da República, mas neste caso a autorização tem de passar pelo primeiro-ministro, de contrário Teixeira dos Santos estaria a atribuir o subsídio a si próprio.
A lei que atribui o subsídio de alojamento tem 30 anos. A antiguidade nota-se: o diploma considera que os encargos da mudança para a capital são «agravados pela rarefacção de habitações passíveis de arrendamento».(Sol)